Voltamos e, para quebrar o espírito de “novo ano, mesmo desespero”, o Cinema Preto desta semana sugere um documentário com potencial existencialista, reflexivo e atemporal: Time, filme dirigido por Garnett Bradley e lançado em 2020.
Por que assistir Time?
Em 1997, Robert Richardson e seu primo assaltam uma cooperativa de crédito. Sua esposa, Sibil Fox Richardson, era a motorista de fuga. O objetivo era salvar a loja de artigos de hip-hop que eles tinham em Los Angeles, mas o ato sentenciou a vida do casal. Fox Rich cumpriu uma pena de 3 anos e meio, e Rob foi condenado a 60 anos de prisão sem liberdade condicional ou qualquer chance de mitigação da sentença.
“Pessoas desesperadas fazem coisas desesperadas. É simples assim”, explica Fox Rich em um momento do documentário, mas Time não é um filme em que os personagens centrais justificam suas atitudes ou refletem sobre seus arrependimentos. Em 81 minutos, o documentário acompanha a vida de Fox 21 anos depois da prisão de seu marido e mostra como essa mulher conseguiu criar seis filhos, se tornar uma empresária e ativista enquanto lutava para trazer o amor de sua vida de volta para casa.
Time mostra os momentos mais burocráticos como as inúmeras ligações para juízes e suas secretárias, e as artimanhas utilizadas por sua heroína para se conectar com esse sistema, e também marcos da vida da família que segue: a formatura e a vida acadêmica dos filhos, por exemplo.
O grande trunfo do documentário, no entanto, está na costura entre as imagens gravadas em branco e preto pela cineasta Garnett Bradley e o extenso arquivo pessoal fornecido pela família. Como forma de resistência, Fox Rich gravava mensagens e filmava o dia a dia de seus filhos para mostrar para o marido. “Eu queria ter certeza que ele não seria esquecido, que é o que a prisão faz com as famílias”, explica Fox para o Los Angeles Times.
Assim, Time estabelece uma viagem temporal entre presente e passado em que a ausência é o grande conector. A pauta do encarceramento em massa é central para o movimento negro e, logo, para cineastas que estudam como o sistema prisional destrói nossas comunidades. O que está em jogo aqui é a dor causada dentro de uma família, a tenacidade necessária para mantê-la unida e como o tempo é colocado em suspensão.
Com imagens em preto e branco, filmagens em arquivo e um tema tão íntimo quanto universal, Time se torna atemporal. Quantas outras famílias Richardson existem? E quanto mais tempo o sistema prisional injusto vai tirar delas?
Terceiro ato
Time está disponível na Amazon Prime.
É impossível não relacionar esse documentário comA13º Emenda, da Ava Duvernay. Os dois filmes são incríveis formas de se educar sobre o assunto.
Mas se tiver pouco tempo, Garnett Bradley tem um outro documentário de 12 minutos sobre uma jovem de 20 anos que está tentando decidir se vai se casar com um homem que está cumprindo uma sentença de 10 anos. O doc chama Alone e está disponível no The New York Times.
Pós-Créditos
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Direção: Garett Bradley
Edição: Gabriel Rhodes
Fotografia: Justin Zweifach, Zac Manuel, Nisa East